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Perfil do brasileiro em situação de rua é de homem negro e alfabetizado
Foto: Agência Brasil

Ele tinha 12 anos quando caiu nas ruas. Conflitos familiares foram fundamentais para ser deixado à própria sorte, entre violações e julgamentos, em São Paulo, a maior cidade do país, ao longo de quase 20 anos. Hoje, Anderson Lopes Miranda, aquele menino que foi retirado da mãe, em um contexto de violência doméstica, deu a volta por cima e passou a lutar em prol da melhoria das condições de vida de quem ainda não tem um teto para chamar de lar.

A história descrita no parágrafo anterior está detalhada no Caderno de Estudos n.º 37, publicado pelo Ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, em dezembro de 2024. O documento foca na população em situação de rua e traça conceitos, métodos de contagem e políticas públicas. O texto foi analisado pelo jornalismo da Band, com o auxílio da ferramenta Pinpoint, do Google.

Na publicação, Anderson narra um pouco da própria história e defende a criação de políticas públicas para atender e reabilitar a população em situação de rua, com iniciativas que envolvem várias frentes: acesso à moradia, saúde, educação e emprego.

Agora, além de atuar como palestrante e integrar o Movimento Nacional de Luta em Defesa da População de Rua, Anderson ocupa a presidência do Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para a População em Situação de Rua (Ciamp-Rua), vinculado ao governo federal.

Números preocupam

Na contramão das oportunidades que cruzaram a vida do Anderson, outras centenas de milhares de homens, mulheres e crianças ainda seguem, por algum motivo, numa realidade em que pontes, marquises e calçadas são transformadas em casas. Esse cenário se revela ainda mais crítico num contexto em que, em um ano, o número de pessoas em situação de rua teve aumento de 21% em todo o país.

No Brasil, essa alta leva em consideração o período entre fevereiro de 2024 (263.789) e fevereiro de 2025 (320.386). Os dados são contabilizados pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, com base na população inscrita no Cadastro Único (CadÚnico).

Desde agosto de 2022, os dados apresentados pela Secretaria de Avaliação, Gestão da Informação e Cadastro Único (Sagicad) indicam uma curva crescente no total de famílias em situação de rua. Por trás desse conglomerado, um perfil em particular se destaca: homem negro, alfabetizado e que já trabalhou com a carteira assinada.

Lançado em dezembro de 2023 pelo Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), o Plano de Ação e Monitoramento para Efetivação da Política Nacional para a População em Situação de Rua detalhou esse perfil, baseado em dados do CadÚnico, registrados em julho de 2023. Veja abaixo:

recorte de gênero - masculino (88%);

recorte etário - adulto (57% têm entre 30 e 49 anos);

recorte racial - pessoas negras (pardas, 50%, e pretas, 18%);

nível de instrução - pessoas que sabem ler e escrever (90%);

egressos do mercado de trabalho - empregado com carteira assinada (68%).

Plano prevê investimento de R$ 1 bilhão

Outra característica pertinente ao perfil da pessoa em situação de rua, no Brasil, diz respeito ao local de nascimento. Nesse cenário, 38% estão na cidade em que se encontram atualmente, 57% estão em outro município e 5% são provenientes de outros países. A maioria desses imigrantes são da América do Sul (54%), dos quais 43% são de origem venezuelana.

Com base nesses e tantos outros dados, as autoridades são abastecidas com as informações necessárias para a criação de políticas públicas que minimizam os problemas enfrentados pelas pessoas em situação de rua. O “Plano Nacional Ruas Visíveis”, por exemplo, buscar colocar em prática as iniciativas voltadas para essa população. Anunciados em dezembro de 2023, os investimentos federais se aproximam de R$ 1 bilhão (R$ 982 milhões), envolvendo 11 ministérios e sociedade civil organizada.

Situação de São Paulo

Conforme os dados disponíveis, em São Paulo, a situação parece ser mais urgente. Enquanto o aumento da população em situação de rua, em nível nacional, foi de 21%, na maior cidade do país, a variação foi de 40%, segundo o Sagicad. Em fevereiro de 2025, o número absoluto de famílias cadastradas era de 90.425. No mesmo período do ano passado, 64.471.

O que, para muitos, é apenas uma percepção de que há mais pessoas em situação de rua na megalópole do país, baseados até mesmo no senso comum, para o banco de dados que contabiliza cada perfil que se distribui pelos logradouros cidade, isso já uma realidade. Inclusive, esse cenário se agravou com a pandemia não só em São Paulo, mas em todo o país.

São Paulo, Rio e BH lideram ranking

No ranking dos municípios com a maior população em situação de rua, outras grandes cidades aparecem no Top 5. A seguir, veja as 10 com os piores indicadores, referentes a março de 2025:

São Paulo: 91,9 mil;

Rio de Janeiro: 21,6 mil;

Belo Horizonte: 14,3 mil;

Fortaleza: 9,7 mil;

Salvador: 9,3 mil;

Brasília: 8,2 mil;

Porto Alegre: 5,5 mil;

Curitiba: 4,2 mil;

Boa Vista: 3,7 mil;

Florianópolis: 3,6 mil.

“Soluções coletivas”

Para além de governos, iniciativas da sociedade civil entram em cena como forma de oportunizar melhores condições àqueles que vivem nas ruas. É o caso da SP Invisível, atuante em São Paulo desde 2014, numa frente que, acima de tudo, busca promover dignidade e dar visibilidade aos corpos que passam despercebidos, dia após dia, pelos milhões que cruzam as ruas e avenidas da cidade.

Mais que campanhas de agasalho e entrega de alimentos, o projeto se coloca como uma ponte que possibilita que a pessoa em situação de rua encontre “caminhos reais de transformação”. Nesse bojo, entram escuta ativa, acolhimento, capacitação profissional e oportunidade de geração de renda.

“Buscamos sempre fortalecer os vínculos sociais e mobilizar a sociedade para quebrar estigmas e construir soluções coletivas (André Soler, CEO e fundador da SP Invisível)

Plano da prefeitura de São Paulo

Por meio de uma portaria intersecretarial, a prefeitura de São Paulo lançou o Plano Municipal de Políticas para a População em Situação de Rua, em 2016. Entre os objetivos, foco no acesso a repúblicas provisórias e centros de acolhida, acompanhamento médico e psicossocial, profissionalização, rede de estímulo à geração de renda, entre outras iniciativas.

Uma nota da prefeitura de São Paulo enviada ao Band.com.br destacou números abaixo dos contabilizados pelo governo federal. Segundo a gestão municipal, o Censo da População em Situação de Rua apontou 32 mil pessoas nessa condição, em 2021, um trabalho de coleta de dados feito por mais de 200 profissionais.

A prefeitura de São Paulo também reforçou que possui a maior rede socioassistencial da América Latina para atender a população em situação de rua, com aproximadamente 28 mil vagas em 376 serviços de acolhimento. Nesse cenário, o governo municipal ainda inclui aumento nos recursos para assistência social, de R$ 2 bilhões em 2022 para R$ 3 bilhões em 2024, e programas de segurança alimentar, os quais servem mais de 4 milhões de refeições para pessoas em vulnerabilidade social.

Em São Paulo, as principais formas de encaminhamento para os atendimentos da prefeitura são por meio do Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP), Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas).

“Cair na rua é fácil. Sair da rua é difícil”

Para o fundador da SP Invisível, entrevistado pelo Band.com.br, o Estado brasileiro não responde ao problema como deveria. Em vez de traçar estratégias integradas de longo prazo, as autoridades optam por ações pontuais e emergenciais. Soler acredita que o Brasil precisa se unir em torno de um projeto consistente e com a participação do poder público, da iniciativa privada e da sociedade civil.

“Precisamos investir em políticas de moradia digna, como o modelo housing first (moradia primeiro), em centros de acolhimento adaptados às diversas realidades e em programas de geração de renda, saúde mental e reinserção social. O investimento social privado pode ser um grande aliado, desde que se comprometa com ações de longo prazo e com foco na dignidade”, concluiu Soler.

Fonte: Band.
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