
O Estado brasileiro está em desvantagem na guerra contra o crime organizado. A avaliação, do escritor e professor de processo penal Edilson Bonfim, é de que a Constituição Federal concentra garantias processuais excessivas aos acusados, enquanto deixa de contemplar de forma clara os direitos das vítimas. Essa estrutura jurídica é apontada como um dos fatores que limitam a ação policial e enfraquecem a capacidade de resposta do poder público.
“O Estado brasileiro está perdendo a guerra e por uma razão simples: o Estado está engessado em garantias constitucionais que não fazem sentido terem sido constitucionalizadas, garantias processuais que torna tudo nulo, porque passa a ser uma adoração à forma”, disse em entrevista ao Canal Livre.
Segundo a análise, o país se tornou o que mais constitucionalizou direitos de acusados no mundo ocidental, criando um sistema que valoriza a forma e abre margem para anulações processuais. Essa lógica é interpretada como um reflexo da filosofia de Estado e da política criminal adotada desde a redemocratização.
“É o país no mundo ocidental que mais constitucionalizou garantias processuais. Como se o problema fosse garantias aos acusados e não às vítimas. A palavra vítima você não encontra protegida na Constituição Federal, mas os direitos dos acusados, muitas vezes. Isso significa uma filosofia de Estado e de política criminal”, afirmou.
Garantias e fragilidade policial
A consequência prática desse modelo é uma polícia que atua como braço limitado do Estado, sem capacidade de acompanhar o avanço do crime organizado. Enquanto facções dispõem de recursos financeiros praticamente ilimitados, inclusive para corromper agentes públicos e influenciar setores estratégicos, a atuação das forças de segurança segue engessada por entraves legais e burocráticos.
O contraste gera um cenário de enfrentamento assimétrico. A criminalidade avança sem restrições enquanto o Estado lida com regras rígidas e obstáculos jurídicos que retardam investigações e processos.
Risco de “colombinização”
Edilson Bonfim alerta ainda para o risco de o Brasil reproduzir a realidade vivida pela Colômbia nos anos 1980, durante a escalada de poder do cartel de Pablo Escobar. O termo “colombinização” é usado para descrever a possibilidade de o país assistir ao fortalecimento do crime organizado em níveis comparáveis ao narcotráfico colombiano daquela época.
Nesse cenário, a violência e a influência de facções poderiam ultrapassar a capacidade do Estado, comprometendo a governabilidade e a segurança pública. A advertência é de que o problema já está posto e visível, mas não reconhecido na devida proporção.
O recado central é de que, sem mudanças estruturais e uma nova forma de enfrentar a criminalidade, o Brasil seguirá em desvantagem, ampliando o desequilíbrio entre as regras do Estado e a atuação sem limites das organizações criminosas.